quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Crianças-índigo: uma forma de discriminação?

ILUSTRAÇÃO MÍSTICA SOBRE A IDEIA DE CRIANÇA-ÍNDIGO

Há, no chamado "movimento espírita" brasileiro, uma corrente mais próxima do misticismo esotérico (do qual um dos expoentes seria uma misteriosa figura chamada Ramatis), que defende a tese de que estariam se consolidando uma geração de pessoas "evoluídas" que iriam liderar a evolução da humanidade na Terra.

Essa corrente, da qual se respalda o anti-médium baiano Divaldo Franco, busca superestimar um mito que, nos EUA, foi criado por um ex-casal dotado de imaginação mística e lançado para vender livros às custas de pretenso profetismo.

Esse mito é o das "crianças-índigo". O antigo casal, hoje separado, é o radialista e técnico em áudio Lee Carroll e a cantora Jan Tober. Carroll disse que recebeu, em 1989, uma mensagem de uma entidade extra-terrestre chamada Kryon, tida como "de máxima evolução", que teria anunciado a chegada de "mensageiros" que promoveriam a evolução humana na Terra.

A ideia gerou vários livros, que viraram sucesso de vendas, e as ideias foram apreciadas e sistematizadas por Nancy Ann Tappe, parapsicóloga, também norte-americana. Ela estabeleceu os conceitos do que se entende como "criança-índigo" e "criança-cristal".

A "criança-índigo" seria um estágio de "semi-evolução", em relação à "criança-cristal", considerada de "evolução máxima". Mas ambos seriam atribuídos à "inteligência sofisticada" e uma personalidade "diferenciada", sendo a índigo mais "rebelde" e a cristal mais "espiritualista".

Os dois tipos seriam associados a pessoas hiperativas, que seriam capazes de exercer as mais diversas atividades, com profunda inclinação intelectual ou artística e de uma evolução moral peculiar, Sua inteligência se manifestaria desde a infância e, cronologicamente, teriam nascido a partir de 1970.

A tese é rejeitada por especialistas em pediatria e psicologia infantil, por não apresentar embasamento científico e pela compreensão de caráter eminentemente místico. Além disso, não existe uma clareza sobre vários aspectos das pessoas "índigo" ou "cristais", um termo tão atraente quanto o termo "alfa" atribuído às mulheres dotadas de sofisticada inteligência e sensibilidade.

PRECONCEITO CONTRA INTELIGENTES?

No Brasil, a tese é associada às pregações verborrágicas de Divaldo Franco, famoso pelo tom professoral com que realiza suas palestras, fazendo à sua maneira a missão do anti-médium (que rejeita a função intermediária do médium para ser o centro das atenções como dublê de pensador filosófico).

Diz ele que índigos e cristais já teriam nascido e estariam em ação no Brasil. Como um dos entrevistados do documentário Data-Limite Segundo Chico Xavier, de Fábio Medeiros, Divaldo anuncia em suas palestras que a evolução da humanidade já "ocorre" desde 2012 e que o estágio de "regeneração" ocorreria em 2052, depois das "transformações" posteriores a 2019.

Mas não é isso que acontece na realidade. Que há um maior debate público nas mídias sociais, em que pese, por outro lado, focos de intensa imbecilização cultural, isso é verdade. Mas não há um sinal de "índigos" ou "cristais" agindo constantemente na sociedade brasileira, aos montes.

Além disso, os aspectos nebulosos dos "índigos" e "cristais" nos fazem perguntar quem realmente são uns e outros. Seriam os funqueiros? Ou os padres aeróbicos? Seria Luciano Huck? Seria Valesca Popozuda? Seriam os intelectuais pró-bregalização? Seria o Neymar? Seria o Flávio Bolsonaro, filho do "sábio" Jair Bolsonaro, provável líder do tal "coração do mundo"?

Se os "índigo" fazem trolagem na Internet ou arrastões nas praias, eles "aproveitaram mal" sua inteligência e seu alto nível moral? Ou então foram desvirtuados pelos "irmãozinhos sofredores"? E que moral elevada eles trazem? A da "voz do silêncio"? Que cultura que eles pregam, a da mediocridade "bem amestrada"?

O Brasil sofre uma violenta crise e os espíritos mais evoluídos que existem no país não possuem qualquer tipo de visibilidade. Quando criam blogues, até atraem seguidores, mas é um a cada duas semanas e, no meio do caminho, algum seguidor deixa de seguir, por achar determinado texto "muito escandaloso" ou "desagradável".

Por outro lado, ficamos imaginando se essa ideia de "crianças-índigo" ou "crianças-cristal", em que pese a evocação "positiva" de Divaldo Franco, não seria uma forma de preconceito ou discriminação contra pessoas dotadas de muita inteligência e evolução moral, diante do "mundo cão" em que vivemos?

Não bastassem as interpretações confusas de diversas pessoas que, dependendo do ponto de vista, podem definir como "crianças-índigo" até mesmo torcidas organizadas que brigam e se matam nos estádios, o termo, assim como o derivado "cristal", seria uma forma de "isolar" pessoas dotadas de um perfil mais diferenciado e evoluído.

Da mesma forma, existem os termos "alfa" para definir mulheres "diferenciadas" para isolá-las da visão machista do papel duplo da mulher moderna: a moça intelectualizada e independente que precisa ter um marido "mais importante" ou a mulher submissa ou vulgar condenada ao celibato.

Seria, na verdade, uma visão "discriminatória", que estabeleceria tanto cobranças quanto restrições para as pessoas classificadas como "índigos" ou "cristais", na medida que "somente" elas podem ser inteligentes e moralmente evoluídas, sendo um rótulo que expressa mais um caráter "excepcional" do que o anúncio de um tipo avançado de comportamento humano.

Isso pode mais atrapalhar do que ajudar, e travar ainda mais a evolução planetária, isolando pessoas evoluídas e bastante inteligentes em rótulos que poderão ser vistos como "anormais", enquanto ser "normal" passa a ser associado à mediocridade, à mesquinhez e à frivolidade.

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