quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Enviamos carta para a USP sobre o caso Missionários da Luz


Diante do grave equívoco dos pesquisadores do trabalho Historical and cultural aspects of the pineal gland: comparison between the theories provided by Spiritism in the 1940s and the current scientific evidence, os autores e acadêmicos Giancarlo Lucchetti, Jorge Cecílio Daher Jr., Decio Iandoli Jr., Juliane P. B. Gonçalves, e Alessandra L. G. Lucchetti, aqui conhecido, resolvi escrever um e-mail para a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

O problema é sério, porque o trabalho supôs uma "prova" de que o suposto espírito de André Luiz, através do livro Missionários da Luz, divulgado por Francisco Cândido Xavier, teria "antecipado conhecimentos científicos complexos" em até seis décadas, não tem a menor coerência.

Servindo-se de bibliografia publicada a partir de 1977, fora o referido livro de "André Luiz", único título dos anos 1940 (data de 1945) registrado entre o material pesquisado, os autores não consultaram as fontes originais, portanto não têm autoridade de presumir a tese de pioneirismo ao fictício "André Luiz".

Escrevi este e-mail, reproduzido abaixo, que foi enviado ontem, para leitura dos seus acadêmicos. Esta mensagem é trazida para publicação aqui para que as pessoas percebam o tom do e-mail enviado, numa tentativa de alertar a comunidade acadêmica da irregularidade que desqualifica o resultado do trabalho sobre Missionários da Luz, monografia publicada em 2013.

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Prezados diretores da Faculdade de Medicina,

Quero fazer denúncias sérias sobre alguns pontos graves que desqualificam pesquisas acadêmicas que supostamente comprovam cientificamente atividades referentes à suposta mediunidade de Francisco Cândido Xavier. Embora eu não fosse um especialista em Medicina, pude realizar pesquisas que, dentro dos meus limites de conhecimento, afirmam os equívocos correspondentes ao estudo divulgado no artigo  Historical and cultural aspects of the pineal gland: comparison between the theories provided by Spiritism in the 1940s and the current scientific evidence, publicado no periódico Neuroendocrinology Letters, em edição de 2013.

O artigo - disponível em http://www.amebrasil.org.br/2011/sites/default/files/34_8_Lucchetti_745-755%20published.pdf - comete uma grave falha quando atribui ao suposto autor espiritual "André Luiz" (que minhas pesquisas constataram ser um autor fictício, sem relação com médicos que diversas teses atribuem como última encarnação do suposto espírito) um pioneirismo de 13 a 63 anos na divulgação de conhecimentos tidos como "bastante complexos" no livro Missionários da Luz, em 1945.

De acordo com os autores, esses conhecimentos, referentes à glândula pineal, teriam (supostamente) antecipado conceitos que "só seriam conhecidos" pela comunidade científica a partir de 1958, com uma "confirmação plena" apenas nos últimos sete anos. Eles alegam que a bibliografia dos anos 1940 era "extremamente escassa e altamente conflituosa" e que "André Luiz" teria exposto "suas ideias" através de Chico Xavier, "médium" sem qualquer tipo de formação no ramo da Medicina.

Há falhas sérias na hipótese de pioneirismo, uma vez que os dados da bibliografia enumerada pelos autores - entre eles, o médico Jorge Cecílio Daher Jr., da Associação Médica Espírita - só incluem obras produzidas a partir de 1977 que, embora citassem documentos científicos sobre a glândula pineal publicados nos anos 1940, não podem, por suas próprias razões, exprimir o conteúdo integral das obras originais.

Quem trabalha com monografias sabe muito bem da diferença entre o conteúdo original de uma obra original pesquisada e seu aproveitamento parcial de uma obra posterior. Ninguém irá reproduzir o trabalho inteiro da fonte, mas aproveitar parcialmente seu conteúdo, numa interpretação nem sempre fiel à obra original. Até porque se trata de uma interpretação de textos de diversas fontes, é natural que apenas aspectos parciais das obras originais sejam descritos, numa abordagem nova e diferente do que foi antes trabalhado.

Isso significa que os autores do trabalho falharam gravemente, quando interpretaram que a bibliografia sobre glândula pineal era escassamente discutida antes de 1958, fazendo supor que os conhecimentos atribuídos a "André Luiz" eram inéditos e pioneiros, como se aspectos relacionados, por exemplo, à produção de hormônio (mais tarde denominados por Aaron Lerner como melatonina), nunca tivessem sido discutidos na época de Missionários da Luz.

Mesmo conceitos e teses científicos descobertos em uma dada época são largamente discutidos e cogitados bem antes de sua descoberta ou comprovação. Na verdade, "descobertas" são confirmações de algo que já foi testado ou debatido bem antes, e soa risível que os autores da referida pesquisa citem como "altamente conflituosas" as obras dos anos 1940. Não é da natureza do debate científico que obras sejam conflituosas?

A falta de uma consulta rigorosa e vigorosa de livros publicados até a época de Missionários da Luz, desde o famoso Manual da Anatomia Humana, livro de 1920 dos autores Alfredo Monteiro e Benjamin Batista, famosa obra brasileira sobre o tema, até Handbuch der mikroskopischen Anatomie des Menschen, de Wolfgang Bargmann, principal estudioso de glândula pineal muito apreciado naquela época, desqualifica seguramente a tese de pioneirismo atribuída a "André Luiz".

Isso porque a falta de consulta das fontes originais de 1940, o que faz os autores da tese sobre Missionários da Luz desconhecerem do exato conhecimento das obras dessa época, limitou-os a conhecer, por segunda mão, os trabalhos da época em vagas e genéricas citações em fontes posteriores, que nem sempre trouxeram alguma noção do que havia se discutido até 1945.

É muito grave essa falha, e isso faz com que os autores deixem de ter exercido o necessário rigor científico de analisar os conteúdos das fontes originais, daí que, diante desse argumento, não é preciso ser um bacharel em Medicina (minha especialidade é Jornalismo) para apontar a falha de método de pesquisa dos autores do trabalho sobre Missionários da Luz.

Todavia, se eu pudesse ter sido um especialista em Medicina, e sobretudo nos assuntos sobre anatomia, glândula pineal, melatonina, e um estudioso sobretudo dos autores que publicaram trabalhos entre 1940 e 1945, apontaria, com toda a certeza, falhas ainda piores que seguramente desqualificariam a validade da tese apresentada pela equipe que realizou a monografia sobre Missionários da Luz. 

Se eu tivesse nas condições de um pós-graduado em Medicina, nas condições acima descritas, teria mais condições de apresentar provas científicas que não só contestassem o pioneirismo de "André Luiz", como apontasse no referido livro de 1945 não uma antecipação de anos ou décadas, mas uma defasagem de, pelo menos, dois anos ou mais.

Não vou apresentar meu nome verdadeiro, uma vez que, discutindo os equívocos cometidos pelo "movimento espírita", estou sujeito a sofrer ameaças por seus adeptos, já que existem casos de pessoas que sofreram ameaças ou até mesmo cyberbulling por causa de seus questionamentos, desde jornalistas de O Cruzeiro que investigaram o famoso caso da ilusionista Otília Diogo até casos recentes como o do analista espírita Jorge Murta, falecido há pouco tempo.

As ideias aqui expostas foram publicadas na Internet sob o seguinte link: http://data-limite-2019.blogspot.com.br/2015/02/explicando-melhor-o-erro-dos-academicos.html

Sem mais a escrever
"Senhor dos Anéis"

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