sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Por que o Brasil insiste tanto no atraso?

PROPAGANDA DE MENSAGEM RACISTA PUBLICADA NA REVISTA A CIGARRA, DE 1919.

É chocante a realidade que o Brasil vive e que permite retrocessos mil em nosso país. A volta da plutocracia ao poder e a sutil implantação de uma agenda retrógrada - apesar dos desmentimentos do presidente Michel Temer, que representa as forças conservadoras - revela uma situação surreal vivida no país, que deixa o resto do mundo perplexo e de queixo caído.

Juristas com compreensão parcial e tendenciosa podem fazer prevalecer suas decisões nos rumos do país, respaldados por uma decadente mídia cujos empresários não só vivem de riquezas abusivas - como os donos das Organizações Globo e dos grupos Folha, Abril e Estadão - como são sonegadores de impostos e usurpadores de verbas públicas.

Como é que se aceita isso? As pessoas que se indignaram com os governos do Partido dos Trabalhadores, superestimando seus erros e desprezando seus acertos, se vestindo com a camiseta da (corrupta) CBF para pedir a saída de Dilma Rousseff, agora estão felizes diante de um país desgovernado comandado por um presidente ilegítimo, sem respaldo popular e com um projeto político instável e cheio de propostas retrógradas.

O espírito do tempo dos brasileiros é dos piores possíveis. Se apoia uma "cultura popular" que nada tem de popular e é movida por ídolos caricaturais que, apesar da origem humilde, mais parodiam do que expressam as classes populares e ainda são sustentados ou patrocinados por oligarquias regionais e grandes empresários de mídia.

É um período de profundo fanatismo religioso, de uma mal disfarçada recusa ao saber e de uma complacência com as interpretações levianas das leis, quando isso favorece os interesses das multidões "indignadas" ou das elites detentoras de privilégios. É uma tentadora inclinação para o atraso que faz até com que a família fascista Bolsonaro seja vista com simpatia por considerável número de pessoas.

Nas redes sociais, o caráter retrógrado é preocupante. O reacionarismo da maioria dos internautas no Facebook, O deslumbramento religioso e as calúnias anti-PT circulando livremente no YouTube. Tudo muito subjetivista, para o bem e para o mal.

Há até mesmo dois pesos e duas medidas. No caso de Madre Teresa de Calcutá, denunciada por que se constatou que suas "casas de caridade" eram verdadeiros holocaustos, depósitos de doentes em condições degradantes, virou santa por ter em seu favor apenas um suposto segundo milagre - o primeiro se revelou uma farsa - que, por sinal, foi um factoide ocorrido no Brasil.

Dilma Rousseff, a ex-presidenta, no entanto foi julgada por crimes que não cometeu, através de medidas fiscais normais em qualquer governo da República, e que haviam sido feitos para favorecer investimentos sociais. E o ex-presidente Lula é condenado por supostas "grandes propriedades" que são um modesto sítio e um barco tipo de pesca, além de um triplex que na verdade ele e sua mulher Marisa não quiseram adquirir.

Sérgio Moro é considerado "herói", da mesma forma que um atrapalhado e gaguejante juiz Deltan Dallagnol, que diante de desastrados arquivos de Power Point, disse que Lula é o "comandante máximo da corrupção da Petrobras", algo que só serve para alimentar a catarse rancorosa dos anti-petistas.

Mas é o mesmo contexto jurídico que, há cerca de 70 anos atrás, deixou passar a fraude escancarada do pseudo-Humberto de Campos de Francisco Cândido Xavier, um embuste que claramente nem de longe corresponde ao estilo original do autor maranhense, mas que deixou os juízes indiferentes, deixando um empate que favoreceu o tenebroso mito de Chico Xavier, hoje apoiado até pela Rede Globo.

Quando se trata de ídolos religiosos, qualquer irregularidade é aceita sem reservas. Para piorar, as pessoas ainda se conformam quando pregadores religiosos, do alto de suas vaidades pessoais de pretensos donos da verdade, dizem que raciocinar é perigoso, falando num duvidoso "tóxico do intelectualismo", quando quase nunca se fala em "tóxico da religiosidade".

São atrasos imensos, não bastassem a prevalência de preconceitos sociais sutilmente defendidos, que até Chico Xavier colocou, no livro Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, de autoria dele e de Antônio Wantuil de Freitas, mas atribuído, de forma oportunista, a Humberto de Campos. Nele, negros e índios são vistos como "condenados morais" e os judeus atribuídos à condenação de Jesus de Nazaré, seguindo abordagem do Catolicismo medieval.

Mas em O Consolador, há ainda o comentário machista de Emmanuel, que ironizou o feminismo dizendo que o "feminismo legítimo" se encontra dentro do lar e da prece. A velha fórmula da mulher religiosa e escrava do lar, ou, quando muito, de "suaves" papéis femininos na sociedade patriarcalista, cujo exemplo inclui até mesmo a primeira-dama Marcela Temer.

Ver que Chico Xavier ainda é visto como "futurista" e "progressista" ao lado de seu discípulo Divaldo Franco é constrangedor e até mesmo asqueroso. Afinal, são dois tipos antiquados, cujo conteúdo ideológico em suas pregações sempre foi ultraconservador, apenas dissolvido no sabor doce da retórica religiosa e nas imagens agradáveis associadas à devoção da fé.

Só isso pede para as pessoas reverem seus valores. O Brasil está apegado a valores retrógrados que consagraram a chegada ao poder do impopular e conservador Temer. Não dá mais para pensar no "novo" como valores velhos tidos como atemporais e fantasiados de "inovadores".

É preciso deixar a zona de conforto de antigos privilégios, antigos totens, antigos dogmas e antigos paradigmas que só servem para manter estruturas enferrujadas de superioridade social que cada vez mais perdem o sentido. O que poucos sabem é que forçar uma volta ao passado pelo saudosismo doentio de antigos valores e antigas hierarquias pode significar um preço muitíssimo caro que os próprios conservadores vão ter que pagar em breve.

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